domingo, 12 de agosto de 2012

PAI



PAI,

Você nem está aqui para que eu possa te abraçar. Durante toda a minha infância você ficou longe, nos seringais, nas matas, nos rios, seringueiro, mateiro, pescador de alimentos e caçador de abrigo para nós, teus filhos.

E durante toda a minha adolescência fiquei longe de você, porque eu acreditava, vivendo no internato da Igreja, que Deus iria curar todas as dores do homem, bastava que eu fizesse a minha parte, seguindo-O.

Agora você me prega esta peça: foi viver com Deus e ainda levou a minha mãe. Hoje me sinto perdido no meio desses homens e dessas mulheres que se tornaram RGs e CPFs, como se o ser humano não tivesse alma, apenas conta bancária e cargo público.

Aqui somos tão poucos a chorar, a abraçar os mais pobres, a compartilhar. E eu nem sei mais se ainda estou entre eles. Nem sei se a minha alma ainda está iluminada dos tempos em que compartilhar e ser solidário era a ação mais grandiosa do homem.

O tempo é tão veloz, tão exigente e pragmático, que o orvalho está desaparecendo, consumido por imensos blocos de concreto e a lua disputa inconsolável o seu espaço com as grandes luminárias artificiais.

Você me ensinou a olhar o mundo de um jeito terno, mas, também corajoso, fraterno. Diariamente, imensas nuvens de poder e de cobiça devoram a minha simplicidade e me tornam um mamulengo do capital que destrói e mata. Sinto vergonha das minhas covardias e dos meus medos de amar com plenitude os seres humanos que sofrem nesse planeta de privilegiados.

Queria poder te abraçar no teu dia, como eu fazia, quando não entendia o teu cinturão, para corrigir as minhas estripulias. Sinto falta do teu sorriso e do teu abraço, dos teus conselhos e das tuas preocupações.

Sei que meus irmãos e minhas irmãs também sentem muito a tua falta. Você era como chuva que cobria a todos sem distinção, nos amava com calma e firmeza e nos ensinava as primeiras palavras da solidariedade, do amor e do tratar bem o próximo.

Você quase não dizia nada, não era pós-doutor, mas nos ensinava com o exemplo, com o olhar, com a simplicidade de trazer para casa a pouca comida para tantos filhos, de cobrir tantos com tão poucos lençóis.

Você foi um pai espetacular!

Se o que temos as traças levarem, não farão parte do patrimônio que você deixou. O teu suor sequer deu para nos deixar uma casa, mas você e mamãe nos deixaram uma montanha de diamante, uma jazida de ouro, porque é um tesouro de exemplo, de vida e de ética.

Quando, às vezes, o ambiente em que vivo inclina-se para situações amorais, eu me lembro de você e me esforço para seguir limpo. As dificuldades que passamos juntos, eu, você, mamãe e meus irmãos, não nos autorizam a tornar-nos lobos do semelhante, não nos ensinaram a perverter o homem bom que Deus deixou dentro de cada um de nós.

No teu dia, eu sequer posso ir à tua casa sagrada, porque está lá do outro lado do mundo. Se estiveres me ouvindo, pede por todos os homens. Diz aí baixinho pra Deus que a humanidade já não aguenta mais de tanto sofrimento, tantas mortes bárbaras, inocentes torturados, seviciados, gente sem casa para dormir uma noite e sem pão para cobrir uma parte do estômago.

Diz aí baixinho pra Deus que nós nos perdemos e não estamos conseguindo achar o caminho de volta, do tempo em que a gente amava de verdade e estendia a mão, que sabia compartilhar e conseguia ser irmão.

PAI!

Um comentário:

Anônimo disse...

Nosso pai está em festa com a bela homenagem.Em sua simplicidade se deleitava em dizer aos amigos que seus filhos eram muito 'sabidos'.Nossa caminhada era sua grande alegria.Quando não podia mais andar, recebia a visita das filhas com seu olhar sereno; muito quieto, respondia nossas perguntas mas não esquecia de perguntar pelos filhos que moravam distante.No caso, você e o Mauro.Nós então repetíamos a função de cada um para ver seu olhar triunfante com olhos marejados e um sorriso leve, quase enigmático.
Parabéns queridíssimo irmão pelo seu Dia dos Pais.
Carinhosamente

Fátima Diniz