quinta-feira, 24 de março de 2011

UM ACRE VERMELHO

Homenagem aos 89 anos do PCdoB

                   ACRE: [adj] De sabor picante ou azedo, forte, vivo. [sm] Medida agrária equivalente a 4.047 m². Estado amazônico com percentual de 10% de área desmatada. Detentor de pujante biodiversidade, em especial na região do Vale do Juruá, considerada uma das mais ricas do planeta em biodiversidade.
                   O Acre não teve um parto normal. De maneira cesariana, o Acre nasceu sob a tempestade da pólvora, do sangue derramado, das armas em punho e dos gritos de guerra. Plácido de Castro, um militar gaúcho que se apaixonou pelo Acre, comandou uma revolução vitoriosa, a Revolução Acreana. Processou-se no Acre uma das primeiras experiências de combate ao colonialismo que, no início do século vinte, já se chamava imperialismo. O Bolivian Sindicate era, na verdade, um sindicato do crime, associação de capitalistas norte-americanos e ingleses que, utilizando o entreguista governo boliviano, pretendia alugar o território do Acre para explorar a hevea brasiliensis, o nosso ouro elástico.
                   Antes da conflagração, um fato fez do Acre uma terra ímpar. A poesia abriu o caminho da pólvora! Uma delegação de poetas, comandada por Galvez, declarou o Acre independente. A dissolução do gabinete de Galvez, sob os auspícios do fraco governo brasileiro, fez aumentar a insatisfação de seringalistas e seringueiros, apressando o confronto armado. A Revolução Acreana, além de tornar o Acre um rico e audaz pedaço do Brasil, foi palco de uma tática de luta que merece ser estudada. A Revolução Acreana soube combinar os interesses de duas classes antagônicas [seringalistas e seringueiros] na direção do mesmo objetivo: expulsar os bolivianos, que haviam se tornado os testas-de-ferro do colonialismo norte-americano e inglês.
                   O Acre é impar do parto à vida adulta! Foi no Acre que nasceu o movimento dos hansenianos, comandado pelo lendário Bacurau, tornando-se um movimento nacional, o Morhan. A discriminação à hanseníase já recebera condenação há dois mil anos, quando Jesus curou um leproso, tocando-o [Mt.8,1-4], realizando um ato proibido para a moral religiosa e social da época. O Acre é pioneiro na luta pela ocupação de terras improdutivas, bem antes do surgimento oficial do MST, tendo em Wilson Pinheiro, assassinado pelo latifúndio, um dos mártires da luta pela terra na Amazônia, junto com Paulo Fonteles, João Canuto.
                   Marca indelével da história do Acre, a saga de Chico Mendes. Líder seringueiro de Xapuri, criou uma forma de luta inédita: o empate. Fazendo confundir ataque com contra-ofensiva, sua tática ganhou aliados, garantindo substancial apoio logístico à sua guerra no meio da floresta assombrosa. Era como se Chico Mendes, ao juntar dezenas de pessoas em frente a um trator e às motosserras, transformasse os atores do empate em árvores, pássaros, raízes, animais, riachos e plantas. Levantavam-se em seu lugar! As mulheres eram a castanheira, a envireira, os cipoais. Os anciãos eram os pássaros, os insetos, as larvas, os animais. Os homens, a sapucaia, a sumaúma, o tucum. As crianças eram os riachos, os lagos, as gotas teimosas do orvalho, o ciclo da chuva. O empate de Chico Mendes é um emblema tático para se estudar na Amazônia!
                   O Acre é ainda uma grande aldeia, onde vivem e resistem os povos indígenas, anciãos, guerreiros pintados de jenipapo, donzelas índias, pajés e curumins. Dezenas de línguas, com variadas unidades genéticas, fazem do Acre uma federação de povos, a dançar sob a luz da lua crescente, a magia da caiçuma e o tambor da pele de leopardo. Kaxinawás [o pássaro que canta o alvorecer] e Yawanawás [queixada, o rebanho inseparável], junto com Ashaninkas, Kulinas de Igarapé do Anjo, Poyanawas, dentre outros, são povos indígenas que amarram o Acre na utopia de uma vida sem amos, onde o pão e alegria são produzidos sob o suor coletivo e compartilhados.
                   Nesse cenário telúrico, mágico [para alguns, mesozóico], o Partido Comunista do Brasil fincou a sua bandeira. Aqui, alguma coisa de aço, pólvora, também magia, dos remansos e cipoais, experiência viva de se combater o pium, a ruçara, o cipó-de-fogo, o impaludismo. Os meninos que se fizeram homens no PCdoB vieram dos longínquos seringais, assustando-se, às vezes, com o mapinguari e o batedor, pastoreando o arrozal das graúnas, estão, até hoje, pastoreando os oprimidos da sanha das graúnas do capital.
                   O PCdoB tem uma história insofismável de luta em defesa do povo acreano. Organizou sindicatos, movimentos juvenis, de cultura, de estudantes, ocupando terras improdutivas, presente nas aldeias indígenas e sendo parte do sal necessário no Parlamento. Atualmente dirige expressivos sindicatos de trabalhadores, do campo e da cidade e detêm razoável experiência administrativa na máquina do Estado.
                   O PCdoB está presente no parlamento estadual acreano desde 1982, quando elegemos Manoel Pacífico (1982-1986), Taboada (1990-1998), Edvaldo Magalhães (1998-2010), Moisés Diniz [2002-2014], Eduardo Farias (2010-2014) e Perpétua Almeida na Câmara Federal [2002-2014]. Estamos presentes em 14 Câmaras Municipais, com 21 Vereadores e 9 Vice-prefeitos. Isso significa dizer que os vereadores comunistas correspondem a 10% do total de vereadores do Acre e o PCdoB está presente em 70% das Câmaras Municipais, incluindo as maiores cidades e Capital. Estamos organizados, com Comitês Municipais, em 22 municípios, com 9.000 de filiados.
                   Que Partido é este? Cresceu como um pé de melancia ou como uma ostra que se fecha frente à presença de qualquer molusco? Acreditamos que construímos algo intermediário. Soubemos aproveitar a terra fértil das alianças políticas, que surgiram da queima de ervas daninhas da direita e alimentam os partidos-membros com o adubo das grandes massas, possibilidade zero em alianças estreitas. O pé de melancia que, às vezes, exaspera os mais apressados, dá visibilidade ao Partido, tornando-o cúmplice da inclusão social que atinge a grande massa da população. Todavia, não deixamos de ser meio ostra, quando intransigimos com a venda de princípios básicos da luta revolucionária.
                    Este é o PCdoB do Acre! Um Partido que aprendeu a resolver problemas internos sem exclusão de dirigentes. Um Partido antenado com as questões nacionais e, ao mesmo tempo, atento às necessidades da aldeia. Um Partido que descobriu que não há nada pior para uma força revolucionária do que o isolamento político. Um Partido que aprendeu a crescer, realizando alianças amplas, sem retirar-se do caminho revolucionário ou vender a honra bolchevista por algumas moedas de prata. Um Partido que soube perceber o jeito que os pobres resistiam, ouvir sua voz quase surda e ousar viver perto deles, organizá-los, ir à missa e ao culto juntos, dançar ao som brega de Amado Batista, apaixonar-se por sua dor, fazer uma promessa ao padroeiro, caminhar na mesma procissão, beber uma pinga no boteco, uma caiçuma na aldeia, dançar o mariri. Um Partido que descobriu que, antes de alçar o povo às grandes tarefas, é preciso fazê-lo esgotar a sua fé nas antigas e anacrônicas formas de luta!
                   Este é o PCdoB do Acre! O Partido Comunista do Brasil!
                   Nossa bandeira é vermelha como o sangue que circula nas veias dos homens livres e está aberta a todos que almejam um país democrático, soberano e socialista!

Um comentário:

EXPEDITO GONÇALVES DIAS disse...

Caro Moizes, de quantos povos, de quantas lutas e sentimentos se faz essa nação. Quantos gritos sufocados e desejos incompletos. Estou aqui lendo seus textos e participando de suas reflexões. Parabéns pelo blog. Grande abraço!